Vidas Cortadas #6

23 01 2011

A vida continua

As semanas passaram voando. Quem imaginaria que a calma voltaria reinar em sua vida pensou Sarah. Estava em seu apartamento entediada de ver aquele programa matinal. Foi fazer o café, enquanto esperava pela ligação de um escritório no qual fizera uma entrevista de emprego uns dias atrás. O homem do vídeo de segurança do hospital não tinha sido reconhecido, mas agradeceu a Deus por não ter ficado de louca. O processo policial continuava e na justiça já corria um processo pela falta de segurança do hospital.

Agora levava uma vida normal, já tinham se passado 5 semanas desde que saiu do hospital, mas ainda parecia ser como uma aranha, tinha vários olhos, andava na rua e sempre tentava ver se tinha alguém a seguindo. Achava isso normal, depois dos traumas e tinha certeza que logo passaria.

Combinou um fondue para o fim da tarde com Tânia e Fernando. Dedicou o dia a limpar a casa e preparar tudo para o encontro.

Olhou o relógio quando a campanhia tocou, eram 17 e meia. Quando abriu a porta teve uma surpresa. Eles tinham trago um homem com eles. Não costumavam não avisar, mas logo o pensamento passou.

-Trouxemos um amigo de trabalho do Fernando. Mateus, Sarah. Sarah, Mateus.-apresentou Tânia.

-Prazer em conhecê-lo, espero que fique a vontade em minha casa.

-Pode deixar que ficarei. Ah, trouxe um presentinho para tentar me desculpar por vir sem avisar – disse Mateus tirando as mãos das costas e deixando a mostra um vaso com uma orquídea.

-Ah, assim eu nunca vou te chamar, só pra você vir e trazer presentinhos. – disse Sarah rindo.

-Não trago presentinhos só quando sou penetra.-Disse acompanhando a brincadeira.

A noite seguiu nesse clima de brincadeiras, sempre evitando o assunto do mês passado. Cerca de 22 horas, os casais se separaram. Tânia foi com o marido para a sala, deixando os outros dois a sós.

Percebendo o afastamento dos outros, Sarah já começou a ficar vermelha de vergonha. Notando, Mateus pediu para que ela não ficasse assim. Depois de algum tempo de conversa e cada vez os rostos estando mais próximos. Ele a envolveu com seus braços, abraçando-a contra o seu corpo e a beijou como se fosse a última mulher.

Não resistindo aos encantamentos de um homem, muito bem selecionado por seus amigos por sinal, deixou ser beijada. As mãos sentiam o cabelo grisalho e liso passar por entre os dedos. Sentia o abraço dominá-la, ao mesmo tempo em que a controlava, a livrava de qualquer perigo.

As horas seguintes passaram rápidas, até que meia noite quando Sarah foi na sala ver como seus amigos estavam, percebeu que Fernando já estava dormindo no sofá. Silenciosamente, voltou para a cozinha. Mateus estava sem camisa, deixando a mostra um físico escultural, que não parecia ser de um homem de quase 40 anos.

-Não queria expulsá-lo da minha casa, mas Fernando está dormindo. Imagino que eles estejam nos esperando.

-Não acredito, mas eu te ligarei amanhã mesmo. Pode ser?

-Pode, sim. Ficarei esperando.

Deu seus contatos para ele e foi para a sala acordar Fernando. Ofereceu a casa para que dormissem. Mas como o de esperado eles recusaram. Levantaram, agradeceram o encontro e se foram.

Sarah deitou no sofá com o sentimento de solidão novamente. Seus pensamentos começaram a voar. Pensou o quanto era estranho se ver ficando com outro cara. Mas até que não tinha sido tão ruim assim. Sentira tesão por ele, não amor… Mas se os encontros continuassem esperava que isso viesse com o tempo. Caso não viesse, mesmo assim seria bom. Os pensamentos continuaram até que viraram sonhos.





Vidas Cortadas #5

17 12 2010

O Homem

Quando teria sossego? Já estava cansado de estar mergulhado em dívidas. Sabia que aquilo não era correto, mas teve que fazer. Esse era o problema de ter “rabo-preso”. No momento em que recebeu a ligação com aquele pedido bizarro, ao mesmo tempo, medonho, decidiu que jamais pediria favores a outra pessoa. Mas fazer o trabalho quitaria suas dívidas… Tinha atrasado a pensão do filho e sua ex-mulher já estava se mexendo para prejudicá-lo ainda mais. Quem diria que ele, cansado de tanto ódio teria que fazer o mal.

Chegando em casa, tirou o jaleco do hospital, era o fim da ultima missão que o babaca lhe tinha dado e foi direto no bar buscar o whisky que já estava na metade da garrafa, resultado dos últimos dias. Servindo-se de uma dose avantajada, já discava para Ricardo. Ainda chamava quando virou todo a dose de uma só vez.

-E aê, capanga, fez o serviço como mandei?

-Sim. –respondeu Olavo.

-Serviço camarada que eu te dei… Escolheu matá-la ou apenas dar um sustinho?

-Senhor, eu dei uma dose mortal de cianeto, mas ela estava muito inquieta. Não sei o que aconteceu.

-Saberei. Não haverá problemas se ela continuar viva. Só a quero ver sofrer… Mas se ela se envolver com alguém, sabe que você será útil outra vez, não sabe?

-Ricardo, eu já fiz o serviço. Isso não estava no acordo!

-Acordo? Eu dito as regras. Você quer ser entregue a polícia?

-Filho de uma puta!

-Acho melhor se acalmar, meu rapaz.- Disse Ricardo soltando uma risada doentia e desligou o telefone.

Desnorteado, Olavo decidiu tomar um banho. Olhou-se no espelho, nunca se vira com tantas rugas antes. O tempo parecia enferrujar o grande galã que já fora. Tirou a roupa, abriu o chuveiro. Parecia sentir cada pingo tocando-lhe o corpo. Esperava que aquela água além de acalmá-lo e o limpasse por fora, também limpasse a repugnância de si mesmo que sentia por dentro.

Após ter ficado cerca de meia hora no banho, saiu sem se secar. Entrou no quarto com paredes velhas e móveis que não pareciam terem sidos comprados para aquele ambiente. Foi morar as pressas naquele apartamento, deixou o seu antigo para a mulher morar com o filho.

Fechou o olho, mas não conseguia dormir. Seus pensamentos inquietos tinham que saber como estava a sua vítima. Rezou e pediu para que ela estivesse bem.

Agora Olavo estava no hospital e via a si mesmo na cama, abandonado pela mulher, com dificuldades para se restabelecer na vida. Incontrolável suas mãos começavam a esfaquear a si próprio deitado na cama. Depois de vê-lo morto. Corria, corria, corria. Um grande abismo. Nesse abismo, um anjo, o salvava.

Acordou ainda com a sensação de queda. Já era quase na hora da entrevista de emprego. Escovou os dentes, se vestiu. No caminho, procurou um telefone público, já no centro do Rio de Janeiro conseguiu um, logo telefonou para a telefonista. Depois de conseguir o número do hospital, ligou. Uma voz doce e robótica de uma recepcionista o atendeu. Rapidamente perguntou do estado de uma paciente chamada Sarah, explicou que era um irmão que estava morando em outro país.

Desligou o telefone tirando um elefante de suas costas. Nunca se sentiu tão aliviado na vida. Ela estava bem.

 





Vidas Cortadas #4

13 12 2010

Suposta paz

Chegando exausta e faminta em casa, Tânia foi para a cozinha preparar um pão. Encharcou de maionese e presunto, fez dois . Encheu dois copos com Coca e gelo. Levou para o quarto.

O marido já estava a sua espera, com o ar condicionado ligado. Surpresa perguntou se o marido não tomaria banho depois de voltar de um hospital, ele contornou o assunto. Tânia comeu o pão rapidamente e se direcionou para o banheiro, onde tomou um banho rápido, mas revigorante. De volta ao quarto viu o marido dormindo. Era incrível o quanto o amava. Deitando-se cuidadosamente na cama, deu um beijo de leve no marido e dormiu sem sentir.

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Na tranqüilidade instável de um hospital, a noite passava. Em um dos tantos leitos, uns com problemas leves, outros com doenças incuráveis e alguns, até com doenças desconhecidas, estava Sarah. Dormindo em outro sonho inquieto. Será que os médicos acreditaram nela? Ela disse que ele estava lá, que ele causou tudo isso. Gritava no sonho, mas se afogava toda vez que abria a boca. Juntava todas as forças em vão. Esperava que isso se restringisse ao sonho.

Amanheceu e Sarah despertou. Quando a enfermeira entrou no quarto Sarah ordenou:

-Eu quero que chamem a Tânia agora aqui. Vocês tão me tratando como louca! Já falei que um homem que eu não sei quem é quer me matar e entrou no quarto na noite passada e me fez beber algo que me fez ter a parada respiratória!

-Senhora, o médico já conversou com seus amigos. Eles estão cientes, você está na UTI e não pode receber visitas, por enquanto.

-Como eles sabem e não fizeram nada? Eu vou fugir daqui. E se ele entrar de novo?

-Se acalme, senhora. – Disse a enfermeira saindo do quarto.

Poucos minutos depois, quando retornou, aplicou um calmante em Sarah que recusava-se a deixar ser aplicada. Como no sonho o esforço tinha sido em vão e mergulhava em mais uma historia criada por sua mente.

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O médico responsável do momento em que aconteceu o incidente conversava com o segurança que se responsabilizava pelas câmeras. Queria saber se a história contada pela paciente era verdadeira. Ela parecia realmente acreditar no que falava.

-Eu já pedi as gravações da tarde anterior! – relembrava o médico.

-Eu sei, senhor. Já fiz as cópias. Elas estão na sua sala, pedi que te entregassem.

-Muito obrigado e desculpe, ando muito nervoso esses dias.

-Te entendo, doutor.

Chegando à sua sala, Dr.Marcos encontrou um pen drive. Rapidamente conectou-o ao computador e começou a ver a gravação. Não tinha muito tempo, estava em horário de trabalho, mas a curiosidade o perturbava. Um funcionário do hospital entrava no quarto da vítima às 16:57, saiu logo depois. Cabelos negros sobre o rosto não permitiam que o médico o reconhecesse. Precisava voltar ao trabalho, mas a imagem daquele homem não saia de sua cabeça, iria em breve procurar saber quem era ele.





Vidas Cortadas #3

9 12 2010

A fugacidade da mente

No hospital, Sarah se nos momentos em que estava acordada só conseguia pensar em uma única coisa: “O que está acontecendo e quem é que está fazendo isso…? Ricardo não iria se importar comigo, a última coisa que ele iria querer na sua vida seria eu.”

De volta ao quarto, Sarah foi informada pelos médicos de que os exames tiveram os resultados excelentes, mas que iria ter que ficar mais um dia em observação. Aquele quarto só trazia a inquietude para ela. Resolveu ligar a televisão, mudou todos os canais cerca de 3 vezes até que desistiu e desligou a TV. Usou os interruptores que ficavam na parede atrás da cama e abriu umas das persianas que haviam no quarto. Ficou um tempo vendo pela janela a movimentação em um dos corredores do hospital. Muitos médicos todos de branco, enfermeiros, muitos eram novos e já tinham uma responsabilidade extrema.  Sarah, não achava que não conseguiria ter responsabilidades como a de salvar uma vida. Já perdida em seus pensamentos, mais uma vez o sono veio lhe levar. Lutando contra ele e tentando se concentrar mais nas pessoas em que passavam. Como se tivesse levado um choque, uma quantidade absurda de adrenalina fora jogada em seu sangue. Não tinha certeza, mas não era possível não ser verdade. Estava confusa, mas pegou o telefone as pressas para ligar para Tânia.

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Tânia não podia contar para o seu marido o que ouvira no telefone, tinha que arrumar uma desculpa e rápido.

-Isso já aconteceu ontem a noite, não quis contar, porque não julguei necessário. Mas um adolescente me ligou, me xingando. – Disse Tânia.

-Amor, não precisa ficar tão assustada. Você tem certeza que só foi isso?

-Sim, mas como usou tantas palavras ofensivas, me chamou de vadia para baixo. Fiquei nervosa, sem reação. Cada vez mais acho que essa juventude está perdi…- antes de terminar a frase o telefone voltou a tocar.

Tânia e Fernando se olharam, sem que Tânia falasse nada, Fernando foi atender.

-Alô? Tânia, Tânia, ele tá aqui! – dizia com Sarah, com uma voz de quem estava prestes a ser assassinada.

-Sou eu, o Fernando! Vou passar para a Tânia, mas você tem que se acalmar. – Disse já passando o telefone para a esposa.

– Oi. O que houve, amiga?

-Eu vi o homem do pub e do trânsito. Ele tá aqui. Esse homem está me seguindo! Não foi coincidência o nosso telefone ter tocado no mesmo horário!

-Sarah, espere um pouco, chego aí em minutos. Temos que conversar!

Nunca tinha se vestido tão rápido em sua vida, em pouco tempo já estava entrando no carro. Foi quando se deu conta que Fernando estava gritando-a afim que de esperá-lo.  Mal ele entrou no carro, já foi arrancando, deixando para trás marcas de pneu na rua. Ele insistia para que ela fosse mais devagar, mas Tânia, nervosa, berrava:

-Será que não vê a gravidade do problema?

– Não, você saiu sem me falar!

-Tá, tem um homem seguindo a Sarah e, provavelmente, ele quem me ligou e também tem ligado para ela.

– E como você não me diz nada?

– Não achei tão importante.

Um barulho ensurdecedor de buzina interrompeu a conversa. Por pouco o carro não se choca com um caminhão.

-Presta atenção, Tânia.

-Desculpa, desculpa.

O marido ainda estava muito confuso sobre aquela história toda, mas não havia muito tempo a perder, tentaria entender mais tarde.

Não estava em horários de visitas, mas isso não importava. Não, para Tânia que já corria nos corredores do hospital em direção ao quarto de sua amiga. Quando chegou, viu uma aglomeração no corredor. Muitos médicos apressados. A grande confusão de vozes a impediu de entender o que acontecia. Esbarrava nos médicos que não entendiam o porquê dela estar ali. Antes de conseguir olhar para dentro do quarto, um segurança de cerca de 2 metros a segurou e outros chegaram logo atrás. Obrigaram o casal a voltar ao hall do hospital.

Depois de uma longa conversa com os seguranças e uma espera longa, um médico chegou trazendo notícias de Sarah:

-Boa tarde. – Disse o médico que não dera conta que já passava das 18 horas.

– Como ela está? Preciso falar com ela! – Falou Tânia, esquecendo-se das condolências.

O médico pediu para que se acalma-se e completo dizendo:

-Sua amiga teve uma parada respiratória, estudamos o que pode ter causado, já que os exames anteriores revelaram que ela estava bem. Iria até receber alta… Mas o socorro foi prestado rapidamente, isso que lhe garantiu a vida.

-Mas ela está bem? Não vai ter seqüelas, né?

-Não, não. Ela está em perfeito estado. Agora vai ficar sob observação em tempo integral da nossa equipe. Pode ficar tranqüila e assim que os novos exames saírem, te falarei como ela está precisamente.

 





Vidas Cortadas #2

7 12 2010

Malditas Memórias

 

Flashes passavam por sua memória, aquela escuridão. Um poço. Uma luz. Sangue. Dor. Gritos. Uma forte luz ofuscou seus olhos, sentiu um abraço. Gelado. Sensação da morte. O arrepio lhe subiu pela espinha. Ricardo. Luxúria. As estranhas lembranças e sensações não paravam de lhe ocorrer, uma forte dor de cabeça. Ouve batidas em uma porta e gritos. Sirenes.

Em meio a tanto branco, viu um rosto. A sirene ia ficando mais forte. Até que percebeu onde estava, se encontrava em uma ambulância. Estava confusa, não se lembrava de muitas coisas, a dor de cabeça era estonteante. Os olhos fecharam, fazendo com que todo o esforço para se manter acordada fosse em vão.

Cerca de 12 horas depois, acordou. No apertado cômodo do hospital se encontrava sozinha. Resolveu esperar e tentar lembrar-se do que acontecera. Aos poucos foi se lembrando, mas a dor começara a voltar. Aquelas ataduras na cabeça, som repetitivos dos aparelhos, lençóis azuis e o frio faziam Sarah se sentir ainda pior. Quando já ia adormecer de novo, Tânia adentrou o quarto com uma enfermeira, ficaram surpresas de vê-la acordada. Tânia foi logo perguntando:

– Como você está? O que houve ontem a noite? Se eu soubesse teria te levado para minha casa, desculpa!

-Não, a culpa não foi sua. Estou bem, só com um pouco de dor de cabeça. Eu entrei em casa tirei a roupa e dormi, lembro-me de acordar com o telefone tocando. Foi você quem ligou?

-Não, mas por coincidência, o meu também tocou uns 20 minutos depois de eu ter chegado. – enquanto a enfermeira olhava os aparelhos, as duas continuavam a conversar – Era um homem, com voz grossa. Disse-me coisas grosseiras que não vem ao caso…

Sarah achou que isso passava de coincidência. Uma pontada de dor atravessou-lhe o cérebro, em seguida a enfermeira pediu que Tânia se retirasse do quarto, pois iriam fazer alguns exames com Sarah.

Tânia se despediu de sua amiga e deixou o hospital com a promessa que voltaria no dia seguinte. Chegando a casa, sentiu um frio atípico. Olhara em volta, para ver da onde vinha aquela corrente de ar e notara pela mais uma vez o quanto bom gosto teve ela mesma e seu marido ao escolherem a mobília a pintura com diferentes tons de azul na sala, o sofá preto combinava com a estante bicolor, sua televisão dava um ar tecnológico e a orquídea dava o glamour que faltava. Não achou nada incomum. A fome já a estava deixando tonta, já eram 3 horas da tarde e ainda não tinha almoçado.

Na cozinha encontrara seu marido já pondo a mesa para o almoço, ele tinha feito salmão ao molho de maracujá. Cumprimentaram-se com o mesmo beijo apaixonado de quando começaram o namoro. Tânia o elogiou pela comida e pela atitude não muito usual de cozinhar aos domingos. Comeram em um clima, inusitadamente, romântico. Acabado o almoço, Tânia se levantou para lavar as louças, mas foi surpreendida com um abraço por trás de Fernando. Seu marido começou a beijar-lhe o pescoço. E já de olhos fechados em êxtase, Tânia o encaminhou para o quarto. Ele tirou-lhe a blusa. Tânia arranhava suas costas, quando ouviu o toque do telefone. Não queria que nada atrapalhasse aquele momento, então continuou. Já estava nua quando o telefone ainda não parara de tocar. Resolveu atender, pois podia ser alguém do hospital. Buscou forças para resistir a tentação de seu esposo, quando conseguiu desvencilhar-se dos seus braços. Correu para o telefone, da cama seu marido  observava-a nua.

Quando pegou ao telefone, Tânia esperava ouvir uma delicada voz de uma telefonista do hospital. No entanto, ouvira uma voz nada doce, era o mesmo homem da noite anterior falara uma única coisa: “Acompanho cada passo que ela dá e se você continuar no caminho dela, vou ter que tirá-la a força. Não conte isso a ninguém pois estou te observando. À propósito, o salmão me deixou com água na boca”. Com um risada doentia desligou o telefone.

Quando voltara a olhar para Fernando, estava extremamente pálida e trêmula. Fernando não entendera nada e insistia em perguntar o que houve, sem obter sucesso. Levou-a até a cozinha e preparou uma água com açúcar para acalmá-la. Depois de alguns instantes em que Tânia pensou em milhares de coisas, começaram a conversar sobre o ocorrido.

 





Vidas Cortadas

7 12 2010

Estava há pouco lembrando daqueles momentos que o dia parece ser infinitamente maior e que a certeza da relatividade da hora é constatada. Nesses dias, a dor parece infiltrar no tecido epitelial, no adiposo e congelar toda nossa estrutura óssea. A impressão que é sentida, é que a dor é eterna e que vamos carregá-la até quando deitarmos na caixa do fim da vida.

Muitos, nesse momento em que o ombro parece não sustentar tanto as dores que com o remédio do tempo amenizarão, mas a sua efemeridade não nos é acreditada, não agüentam a dor e acabam pondo um fim nas próprias vidas. Foi nesse instante em que Sarah Jones resolveu que mais que um fim era preciso, mas também um novo início.

A ligação

Olhando por entre as grades da janela, voltava a sentir aquelas estranhas sensações claustrofóbicas. Via centenas de casas e apartamentos, o que a deixava perturbada, tantas pessoas, tantos empregos, tantas famílias. O que seria ela e seus grandes problemas?

Já não via a hora de se encontrar com Tânia, precisava conversar sobre a bola de problemas que sua vida estava se tornando. Desde que vira Ricardo com outra parece que seus traumas voltaram como fantasmas para perturbá-la, momentos de felicidade e de profunda tristeza já se confundem. Enquanto isso o tempo parecia não passar.

Olhou no relógio, eram 8:43, Tânia nunca se atrasou antes. Já estava impaciente quando viu o carro da sua amiga chegar, nem esperou o aviso pelo interfone, pegou a sua bolsa e desceu os 3 andares de escada.

Sarah entrou no carro, um frio a penetrou, Tânia estava pálida, sem saber o porquê perguntou:

-Você está bem?

-Estou e você? – responde Tânia, desentendida.

– Na medida do possível, você sabe o que vem ocorrendo na minha vida. Para falar a verdade não tem sido nada fácil, odeio ter que ficar desabafando. Você uma hora vai saturar, não vai nem mais querer olhar pra mim.

-Você fala como se eu nunca tivesse ficado horas ao telefone fazendo monólogos.

– Mas quem disse que eu ouvia? – respondeu Sarah brincando.

As duas se entreolharam e começaram a gargalhar. Depois de um tempo decidiram ir para um pub já bem conhecido pelos seus bons vinhos. Era sexta e a movimentação estava pouca para um dia como esse, para a sorte das duas. A luz amarronzada fazia com a parede bege um ambiente agradável. Escolheram um dos cantos para se sentar, em uma mesa para dois com um sofá muito confortável.

Após alguns minutos, um garçom com uma aparência bem límpida e elegante veio atendê-las.

-Boa noite! O que as senhoras desejam hoje?

Após pensarem alguns segundos responderam que gostariam de um bom vinho do Porto. Enquanto esperavam, Sarah sentiu uma estranha sensação de ser observada. Olhou em volta e não reparou ninguém a olhando. Mas um homem em particular prendeu sua atenção, tinha cabelos grandes, sem corte sobre o rosto branco, estava com uma jaqueta jeans e com os braços sobre a mesa e sua mão segurava a cabeça. Parecia esconder o rosto com os cabelos e com a mão.

Sua atenção foi roubada quando o garçom chegou com as taças e o vinho e as serviu, degustou o vinho e sentiu um sabor adocicado descer-lhe a garganta. Quando voltou os olhos para o estranho homem, ele não estava mais lá. Isso a deixou incomodada, mesmo sem saber o motivo.

Após algumas taças, Sarah se sentiu mais à vontade para contar à sua amiga o que a vinha perturbando.

– Tânia, sabe… Você entende que ainda tenho problemas para falar dele?

-Sim, mas não vejo motivos, somos amigas há tanto tempo. Pode contar comigo.

-Sei que posso, mas mesmo assim, parece que algo trava dentro de mim só de pensar.

-Mas você tem que desabafar, sinto que você está sob pressão.

-Vou tentar… Sabe, desde quando vi Ricardo me traindo, nada foi igual. Me sinto a mulher mais feia do mundo. Fui trocada, pisoteada e humilhada. Ela já freqüentava as festas que fazíamos, foi na minha cama e ainda fui posta para fora de casa. Agora morando de aluguel naquela casa, cada momento me faz pensar de quanto tempo eu deixei passar. Abandonei os estudos, o meu antigo emprego e isso tudo por um canalha. – Sarah já se encontrava com os olhos cheios d’água.

-Eu sei, isso realmente deve estar sendo uma barra. Mas como já te disse, você tem que acostumar ver as coisas por um lado melhor, mais reconfortante. Olhe como você tem sorte, não tinha parado com os contraceptivos para tentar engravidar? Pelo menos não engravidou a tempo e só de você, você consegue cuidar.  Tem amigas, como eu, que estão disposta a te estender a mão.

– É vou tentar ver mais assim, vai ajudar mesmo. Mas estou tão sem animo!

– Okay, vamos fazer um trato. Duas vezes na semana vamos sair, uma pra cuidar de você e outra pra bebermos, dançarmos ou comermos algo.

-Não sei bem… – disse Sarah, com feições que a idéia não agradava-lhe muito.

-Não acredito que vai negar o pedido de uma velha amiga, fora que pode deixar que vai ser por minha conta, consegui aquela promoção, juntei uma graninha e vou ficar mega-satisfeita de gastar com você.

Após algum tempo de conversa, já ficava tarde e as duas já cansadas e com os rostos vermelho por causa dos efeitos da bebida , resolveram ir para as suas casas. Tânia entrou no carro, pois o som alto e dirigiu em alta velocidade pelas ruas vazias. Quando parou em um sinal, Sarah viu que já passavam das 2 horas e pensou como o tempo passara rápido. O sinal ficou verde, um carro emparelhou com o de Tânia por pouco mais de um segundo, enquanto a Tânia não dera a partida. Sarah pela visão periférica, achou ter visto o mesmo estranho homem do pub. Desconfiada tentou olhar novamente, Tânia virou a esquerda, impossibilitando.

Chegando a frente de sua casa, agradeceu com um abraço apertado e sentiu o cheiro agradável que sua amiga tinha. Subiu as escadas, segurando bem ao corrimão de mármore branco que contrastava com as paredes acinzentadas que um dia já tinham sido também brancas, sentia as paredes se mexerem. Por um segundo, arrependeu-se de ter bebido tanto. Abriu a porta do seu novo apartamento, soltou uma risada, achara aquilo tudo parecido com um filme de drama. Fechou os olhos e foi para sua cama, tirando a roupa pelo corredor e a abandonando como se fosse algo tóxico. De calcinha, se deitou na cama.  Adormeceu. Quinze minutos depois, o telefone toca. Acordou ainda tonta. Levantou-se em um salto, andando até a base do telefone sem fio, no caminho tropeçou em uma de suas roupas que fora tirada do corpo há poucos minutos. Em uma sensação de queda continua, foi levada ao chão. Seu rosto bateu na quina da estante, depois só lembra da dor e da escuridão.